Discurso pronunciado por Saulo Ramos no encerramento
da
1a. Semana
Cultural Saulo Ramos no dia 8 de junho de 2008.
Foi aqui,
na minha terra, que, neste dia e pela primeira vez, abri os olhos e vi o rosto
de minha mãe. Aqui, na minha terra. Fiz o primeiro gesto, fui saudado pelo
primeiro sorriso e sorri pela primeira vez. Aqui, na minha terra, aprendi que o
sorriso é a janela da alma e por ela entrou, através do sorriso, a alma de
minha terra.
Devo ter
chorado. Não me lembro. Guardo, porém, a sensação do primeiro abraço que me
envolveu, provocado talvez pelo primeiro soluço. Foi aqui, na minha terra.
Meus
primeiros passos nas ruas de areia. Aqui na minha terra, antes do asfalto. As
mãos que me seguraram. Depois, os primeiros tropeções e o impulso do instinto
que me fez levantar pela primeira vez. De pé, aqui, na minha terra, olhei o céu
e contemplei os pássaros. Entendi o sentido azul dos vôos e o rumo dos destinos
na ânsia dos meninos que ousam cavalgar o sol e levam na garupa a magia de
desenhar horizontes.
Fui atrás
deles, daqui, da minha terra, ponto de referência para a minha saudade e o
necessário marco para meu retorno.
Mas, antes
do meu retorno, voltaram minha mãe e meu pai. Estão aqui, na nossa terra,
transformados em raízes e por certo floresçam em todas as primaveras para os
primeiros gestos, os primeiros abraços, os primeiros sorrisos, para as mãos
firmes de todos os pais e todas as mães que seguram todas as crianças de
Brodowski, os meninos de Portinari.
Brodowski
é uma família, a minha família multiplicada em cada família,
renascidas em todas as famílias, pelo milagre da multiplicação do amor.
De outra forma não poderia se, nem eu saberia sentir, a minha terra, fixação de
minhas emoções sem distâncias.
Claro que
enfrentei horizontes desenhados por aquela magia, as mesmas dos pincéis do
Candinho, para a minha cavalgada do destino geometrizados em
cores audazes. Corri atrás deles, alcancei-os, soube decifrá-los e
levantar-me das quedas resultantes de outros tropeções. Girei mundos, conheci
gentes, exerci profissões, cumpri deveres, batalhei com leis, socorri aflições,
enfrentei tribunais, procurei obstinadamente fazer tudo
Em nenhum
momento, porém, deixei de ter consciência do bem maior que me foi dado pela
dádiva do destino, o de haver nascido aqui, na minha terra, o que nos iguala
naquele instante sagrado de ter aberto os olhos pela primeira vez e ter visto o
rosto de minha mãe. Ao invocar este momento, sinto-me dissolvido
Agora
recebo esta fantástica homenagem na instituição da Semana Saulo Ramos, com que
os condutores dessa cidade sufocaram meu já combalido coração. Ainda bem que
sou brodowskiano e resisto.
Confesso,
com a mais absoluta humildade, o orgulho de ter recebido a homenagem, sem
colocar em discussão se a mereço.
A alegria
é maior pela conseqüência maravilhosa dos eventos culturais e artísticos, com a
participação dos jovens, dos mestres, das escolas, em processo de semeadura de
arte, literatura, música, que já deram seus primeiros e valiosos frutos,
colhidos durante esta semana aqui, na minha terra.
Se cada
ser humano por esse mundo imenso amasse sua terra, os homens afastariam de seus
corações o ódio. Nem sequer o conheceriam. Não haveria guerras pelo cuidado de
não se fazer com a terra dos outros aquilo que não
queremos que façam com a nossa. Ou pelo simples exercício de amar. Quem ama não
mata, não agride, não violenta. Muitos dos males
sofridos pela humanidade, pelo menos aqueles pelos homens provocados, resultam
da falta de amor pela terra natal e pela família. Não haverá paz na terra
enquanto os homens não amarem sua própria terra.
Com essa
declaração de princípios, quero agradecer a todos que prestigiaram a Semana
Saulo Ramos, a cujo encerramento tenho privilégio de
comparecer ainda em vida para ver minha gente, meus parentes, meus amigos. E
agradeço às autoridades a iniciativa da Lei n. 1.900/2008, que deu concreção ao
mandamento constitucional de seus corações generosos. Agradeço ao Prefeito
Antônio José Fabbri, ao Dr. José Marcos Passos Valente, à Professora Lúcia
Bueno de Almeida Silveira, Coordenadora de Ações Culturais, filha do meu
querido e sempre lembrado Almeida, brodowskiano até o núcleo da célula tronco
que se multiplicou nas novas gerações. Agradeço aos vereadores da Câmara
Municipal por terem votado a lei 1.900/2008, que jamais será objeto de ação
direta de inconstitucionalidade.Agradeço aos jovens e
aos estudantes, e peço desculpas àqueles que tiveram que lidar com as minhas
poesias, escritas quando também fui um dos meninos de Brodowski.